Millennials: Geração imediatista não liga para aposentadoria

Nascidos entre os anos 1986 e 2002, esses não têm perfil investidor ou de poupadores.

Eu olho para o que acontece hoje e tendo a não gastar muito tempo pensando no futuro, até porque acredito que temos que aproveitar da melhor maneira o tempo que temos e realizar nossos sonhos”. A frase dita pelo bancário Ygor Kauling, de 23 anos, é retrato quase fiel de toda uma geração nascida entre os anos 1986 e 2002 — os jovens conhecidos como millennials. Imediatistas e propensos a dar muita importância às realizações pessoais, que não necessariamente envolvem dinheiro, destacam especialistas, esses jovens não têm perfil investidor ou de poupadores, o que muda a concepção de segurança financeira para o futuro.

Desta forma, os millennials se relacionam de forma diferenciada com as finanças pessoais em relação aos seus pais, a geração que já passou dos 50 anos, os chamados boomers. Assim, ao afastar a ideia de futuro, poucos pensam na aposentadoria ou em criar estabilidade financeira, o que pode resultar numa geração inteira sem renda na velhice, seja ela vinda da Previdência Social (INSS) ou de investimento em previdência privada.

— Há uma falta de visão do próprio futuro, nesta geração millennial, de que precisarão de garantias para ter uma boa velhice. Não surte efeito nessa geração, por exemplo, falar que é necessário investir em previdência ou ter uma poupança. Isso porque são jovens muito temporais, pensam muito no agora, e deixam o futuro para depois. É como se achassem que o tempo não vai passar, por isso, o futuro de longo prazo não é colocado em discussão. Isso gera milhares de pessoas que não poupam, não investem e não pensam na aposentadoria como deveriam — explica Fabio Gallo, professor de Finanças da Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP).

Segundo uma pesquisa recente feita pelo Bank of New York Mellon, o comportamento dos millennials em relação à aposentadoria afetou as instituições financeiras, que ainda não conseguem dialogar com essa geração, que está perdida quando o assunto é poupar dinheiro, lidar com taxas e se programar para a aposentadoria. O estudo diz que 51% dos millennials ainda recorrem aos pais na hora de pedir conselhos financeiros, enquanto no Brasil, por exemplo, 62% não sabem como funciona a previdência.
Uma certa descrença com o futuro e com a aposentadoria pode estar ligada, diz Gallo, ao temor da reforma da Previdência, que gerou nos millennials insegurança em relação ao futuro e, em alguns, quase certeza de que não compensa poupar ou contribuir para a velhice.

— Eu até juntei dinheiro na previdência privada, mas hoje não tenho mais. Acho que lá na frente não vai importar ter uma reserva financeira, até porque não acredito que vá me aposentar — diz o bancário Ygor Kauling.

Os ‘y’ querem criar sua identidade

Avessos à ideia de futuro e descrentes quando o assunto é Previdência, por outro lado os millennials, ou geração Y, são os que buscam realização pessoal e sucesso no emprego. De acordo com pesquisas que buscam entender o comportamento destes jovens, o conceito de realização rompe com o que era essencial, por exemplo, para outras gerações, como fazer carreira de décadas em uma empresa e ter a casa própria.

— Há algumas nuances em relação aos millennials que precisam ser discutidas. A primeira delas é a questão do imediatismo. Há um conflito para estes jovens entre ser o reflexo do que os pais foram e construir a própria identidade. Assim, há uma grande vontade de fazer o que os pais não fizeram, e neste pacote está, por exemplo, viajar, fazer um curso e não necessariamente investir na compra de um bem como carros ou imóveis — explica a professora de Economia e Finanças do Ibmec-RJ Vivian de Almeida.

Uma pesquisa da escola de negócios da universidade de Cambridge, na Inglaterra, aponta um cenário nebuloso em relação aos millenials. Segundo o estudo, a maior parte da geração não têm conhecimento do futuro que os espera e a compreensão das questões financeiras é baixa. Os dados mostram ainda que 46% dos millennials não recebem qualquer informação sobre assuntos financeiros por meio do trabalho ou estabelecimento de ensino. “Sem muito conhecimento sobre o tema, a nova geração subestima o montante que será necessário para financiar a vida pós-laboral”, diz o estudo.

— Esta geração é mais empreendedora e liga menos para trabalhos com carteira assinada. Por isso, os millenials pensam de forma diferente em relação à Previdência e aposentadoria. Muitos deixam garantias de lado, como investimentos em previdência privada ou contribuir para o INSS, por exemplo. Esse pensamento reflete também o país em que vivemos, onde as mudanças conjunturais estão em processo, somado a uma geração que trabalha, mas não coloca isso em primeiro lugar — diz Vivian.

ESTABILIDADE

— Apesar de fazer parte da geração millennial, minha cabeça é um pouco moldada pela geração passada, dos meus pais, com as preocupações básicas da segurança financeira, e a vontade de ter carro e a casa própria. Eu me vejo muito preocupado com o futuro, em busca de construir estabilidade, mas o que não exclui meu igual interesse em viajar, conhecer novos lugares, estar em contato com outras culturas, e levar meu trabalho como artesão para o mundo — diz o artesão Pedro Henrique Cruz dos Santos, de 23 anos.

Entrevista – Humberto Sardenberg, especialista em educação financeira, superintendente da Icatu

O que mais afasta essa geração do planejamento de longo prazo?
Tem um fator juventude que agrava a questão cultural e geracional. Juntar dinheiro para longo prazo ou se proteger de qualquer mazela é anti intuitivo para jovem. Para ele, envelhecer é muito longe e ele acha que é imortal, por isso, afasta a ideia de se planejar e se proteger. Mas o risco existe e a idade correta para se preparar é na juventude, que é quando ele consegue o máximo de juros compostos. Por isso, é preciso começar a investir na aposentadoria com 20 anos. O risco que ele vive é muito alto e para os homens é três vezes mais alto que para a mulher.

O que está agravando a situação?
Vivemos numa sociedade onde as coisas importantes podem ser deixadas de lado e o que agrava o planejamento de longo prazo que os millennials têm essa relação diferente com o trabalho. Mas por outro lado, percebemos que ele começa mais cedo a lidar com contas e questões financeiras.
Essa geração é nativa empreendedora, e sabe de planos de negócios. Percebe que tem que fazer um plano de negócios para ele mesmo, e quer trabalhar com independência financeira.

O que mais afasta esses jovens da Previdência Privada?
Antes os preços de entrada eram muito altos para fazer parte de um bom fundo de previdência e com isso você acabava abrindo mão do público jovem. Hoje o preço dos produtos está diminuindo para atrair esse público, especialmente profissionais liberais, como dentistas e médicos. Mas para chegar a eles a comunicação precisa ser diferente como se você estivesse falando diretamente para um público empreendedor.

Fonte: Bruno Dutra e Pollyanna Brêtas – G1